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Hoje o blogue traz até si, uma entrevista com João Nunes, um argumentista português, que escreveu episódios para a série Inspector Max e que escreveu alguns episódios para a série Liberdade 21. Escreveu guiões para cinema como Mustang, A Selva e o Julgamento entre outros.
Leia aqui a entrevista na íntegra.
CL De onde veio a paixão pela escrita?
JN Lembro-me de, em criança, ainda na primária, estar no pátio da escola rodeado pelos meus colegas, que passavam o recreio entretidos a ouvir as histórias que eu inventava para lhes contar. Mais tarde, era normal ajudar a minha mãe a dar o jantar aos meus irmãos mais novos contando-lhes histórias em capítulos, inventadas na altura (ficaram famosas as aventuras do "Capitão Jorge", inspiradas por um primo mais velho). Já nessa altura tinha a preocupação de os deixar em suspenso no final de cada "capítulo" - os famosos "cliffhangers" - para garantir que no dia seguinte iam querer continuar a ouvir a história. Por isso, acho que este impulso para ficcionar é-me inato e, agora, até estranho ter demorado tanto até chegar à escrita de ficção.
CL Maioritariamente você escreve para cinema, apesar de ter escrito para algumas séries televisivas, nunca pensou em escrever uma telenovela?
JN Já pensei, e até já apresentei duas propostas a duas televisões. Mas acho que ainda não me dediquei o suficiente ao assunto. Escrever uma telenovela é uma coisa especial, que exije processos mentais e métodos de trabalho diferentes dos que eu utilizo normalmente. Para me aventurar a um desafio desses teria de ser com dedicação absoluta e, por razões diversas, numca me tive ainda essa disposição.
CL Qual foi o trabalho que lhe deu mais prazer de fazer ? Porquê?
JN Pode parecer um lugar comum, mas o trabalho que me dá mais prazer é sempre aquele que estou a fazer em cada momento. Quando olho para os trabalhos anteriores, mais do que as suas virtudes, só consigo ver as coisas que devia ter feito de outra maneira. Em relação ao trabalho actual, só vejo o universo de possibilidades que ele me oferece. No caso do trabalho que estou a fazer agora, isso é ainda mais verdade pois trata-se de um projecto muito ambicioso, com possibilidade de repercussão internacional.
CL Como considera o actual panorama para os novos guionistas ? O mercado dos guionistas em Portugal está saturado?
JN Não é possível dizer que o mercado está saturado quando, de todo o lado, se ouve a queixa de que faltam boas histórias, bons guiões. Acredito que a qualidade encontra sempre maneira de se impôr. É como a lei de Gresham na economia: a boa moeda afasta sempre a má moeda.
CL Qual é a sua opinião sincera sobre o cinema Português? Pensa que algum dia vamos conseguir que os filmes portugueses sejam mais visto que os filmes estrangeiros?
JN Não há nenhum país europeu em que os espectadores vejam mais cinema nacional do que estrangeiro. A França, com 45,7%, é o país onde a produção local tem mais sucesso, e, mesmo assim, menos de metade dos bilhetes vendidos em França são para filmes franceses. Mas é vergonhoso que, em Portugal, esse número desça para 2,5% e nos coloque, nessa estatística como em tantas outras, na causa da Europa. Isto tem duas explicações: a recusa de muitos cineastas em criar obras que falem ao grande público; e a incapacidade dos restantes para encontrar a maneira certa de o fazer. Como já disse noutros locais, a solução passará por uma "terceira via" que procure fazer um cinema de espectadores sem ceder ao sensacionalismo e às pretensas "fórmulas" comerciais. E isso passará, inevitavelmente, pelo primado das boas histórias, com o reconhecimento do trabalho dos guionistas.
Mas para isso é preciso dar tempo aos guionistas para fazer o seu trabalho. E tempo, numa actividade destas, só se consegue com dinheiro. Nos Estados Unidos, o valor de um guião de um filme low budget (de zero a 5 milhões de euros) não pode ser, segundo o acordo da associação de guionistas Writers' Guild of America, inferior a 39 290 USD, cerca de 30 000 euros. Em Portugal o valor que o ICA dá como referência para um guião de cinema é no máximo 10 000 euros. Acho que não é preciso dizer mais.
CL Visto que você nasceu e trabalhou em Angola, sendo um dos países lusófonos que mais tem evoluído. Como considera o panorama audiovisual angolano, acha que devia haver mais intercâmbio entre todos os países lusófonos?
JN Não conheço muito bem o que se está a fazer lá agora. Quando estava lá tive a oportunidade de assitir à estreia do filme "O Herói", do realizador angolano Zezé Gamboa, que depois pude conhecer, e gostei muito. É a prova de que com talento e uma boa história de base se podem fazer pequenos milagres.
CL Você sendo presidente da APAD (Associação Portuguesa de Argumentistas e Dramaturgos) Se lhe fosse pedido para ajudar as produções audiovisuais portuguesas, criando uma lei, que lei seria essa?
JNGostaria que qualquer lei que viesse a existir contemplasse mais o investimento no desenvolvimento e escrita de guiões. É preciso que haja muitos guiões escritos para que alguns se imponham pela sua qualidade. Infelizmente, sem apoios para isso, a maior parte dos produtores não pode ou não quer investir em vários projectos simultaneamente, para ver qual é que tem pernas para andar. Assim escolhem um ou dois em que acreditam mais e tentam levá-los até ao fim, mas nem sempre os resultados são os esperados. O ICA e o FICA (e outras entidades) deveriam reconhecer essa necessidade e apostar mais nessa área. É mais fácil, e relativamente mais barato, investir na fase da escrita no que na produção. É mais rentável investir em 10 guiões para escolher o melhor, do que tentar fazer de um guião medíocre um bom filme.
CL Você que escreve maior parte das vezes para Cinema, não acha que o cinema português se devia adaptar aos novos meios, Internet, telemóveis? Por exemplo algumas pessoas pagam 3 € por um videoclip musical da net, porque não pagar 3€ por uma curta metragem ?
JN Acho que seria fantástico, mas essa é a questão que toda a gente está a tentar perceber: como é que se pode ganhar dinheiro com a criação de conteúdos para estes novos meios. As respostas ainda não são claras.
CL Podemos voltar a ver o seu trabalho mais breve possível em que área ?
JN Este anos vou ver estrear pelo menos três trabalhos novos: a longa-metragem "Assalto ao Santa Maria", que está em finalização; os dois telefilmes "Conexão", para a RTP, que também estão nos últimos afinamentos; e as curtas-metragens de "O Dez" (uma das quais eu também realizei), que, igualmente, estão em pós-produção. Mas espero que venha a haver mais coisas...
O blogue Curtas & Longas agradece ao João Nunes pelo o seu tempo disponível para responder a todas perguntas que lhe foram colocadas.
Desejando não só a si , mas também a todos os nossos leitores sucesso a nível pessoal e profissional.
Vou tentar pelo menos conseguir uma entrevista por semana.
Dê uma espreitadela no site de João Nunes,www.joaonunes.com
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